Fogo Posto
I
Estou no centro do país rodeado de incêndios.
Os pinheirais em fogo esbraseiam o ar.
Reguei o telhado e o quintal porque as velhas são muitas.
A vizinha cega, sem qualquer progresso, vai tocando o seu órgão Tornado 4.
A irmã apanha velhas, mostra-mas na mão,
apagadas ou parecendo ou quase,
e fala do carteiro – motorizada aqui,
saco acolá, sapato mais além –
que, presuntivo pirómano, a si mesmo se teria apagado nas águas do Tejo.
II
O aeroplano da lista vermelha é que semeia o fogo
Von Richthofen – passe-montanha, óculos «à aviador», dentes cerrados –
é que vem semear o fogo no reino do verde pino.
Abatido em 18, ressurgiu
com o estampido do guarda-chuva que se abre
e – pano, arame, madeira – ganha altura
para, numa vrille desaparafusada,
vir castigar-nos com sua espada de fogo.
Disse Deus: – Ó aviador, vai-me a essa gente remota
e avia-lhe uns fogos que se vejam!
Polegar para baixo, Von Richthofen
incendiou milhares de hectares em Portugal.
Sua lista vermelha (laranja? limão?)
é vista com frequência na zona centro do país.
Disse Deus: – Basta. Já sinto calor na cara.
Este, que foi um herói ao serviço do Kaiser
– Cruz da Águia Vermelha
‘ Cruz da Águia Negra
‘ Cruz de Ferro – ,
descer quando Deus quer, a incendiário de pinhais?
Credo, custa-me a crê-lo!